Da Hipocrisia (1)
Enquanto a lia sorria pela hipocrisia que ali encontrei. Na verdade, acho que a única coisa de nova que me foi ensinada nos meus tempos de estudante universitária foi a fazer uma leitura crítica de tudo o que lia; daí que em tudo o que leio procure ver o que está para além do óbvio, a ler nas entrelinhas, a perguntar-me porque foi empregue um termo ao invés de outro.
Confesso que o artigo a que me vou referir não suscitou grandes reflexões. É tudo tão óbvio que nem precisamos pensar muito. Não houve sequer a preocupação de dissimular os pensamentos e opiniões inerentes ao assunto em questão: a vitória eleitoral do grupo HAMAS.
Antes de fazer referência ao artigo é necessário fazer notar àqueles que não me conhecem que eu sou desde criança uma apaixonada pelos Estados Unidos, o que não me impede, no entanto, de pensar por mim mesma e fazer uso do raciocínio... é isso que faz de mim uma pessoa inteligente. Importa também dizer que este artigo não procura defender, analisar ou questionar o grupo HAMAS. Importa unicamente analisar o artigo em questão, evidenciando a hipocrisia do jornalista que o redigiu e da revista que o publicou.
Tantas palavras quando vou dizer tão pouco sobre o assunto...
O artigo é pequeno; ocupa apenas uma página e faz referência aos grupos iraquianos que se insurgem à ocupação americana neste país. Não é despropositadamente que este artigo surge nesta edição. Surge como introdução a uma reportagem sobre o grupo HAMAS, na procura pela resposta à questão “how should Israel and the United States deal with what they call a terrorist group?”. Nada melhor que comparar o HAMAS aos grupos iraquianos, reforçando a associação entre HAMAS e terrorismo. Como se tal não bastasse, o artigo intitula-se “Talking to terrorists”. Ao longo de todo o artigo estes grupos não são nunca nomeados e as referências feitas designam-nos como terroristas ou “insurgents” em oposição a “Americans”. Como tal, os militares americanos são usados como sinédoque de toda uma nação e, deste modo, é-lhes dada legitimidade para as suas acções. Eles agem realmente como “police of the world” e não como terroristas que invadiram um país sem a anuência da ONU. Ao contrário dos Americanos, os grupos iraquianos que se insurgem contra a ocupação americana, falam apenas em nome próprio, numa atitude rebelde, individualista e egoísta, sem o apoio de um país ou dos seus cidadãos.
Ora aqui está como se moldam as mentes.
Quando um meio de comunicação apresenta as coisas deste modo, a preto e branco, está a incutir nos seus leitores a sua visão do mundo e dos factos.
Eu não acredito na objectividade do jornalismo porque os jornalistas são humanos e é impossível serem completamente neutros. No entanto, este artigo parece-me por demasiado hipócrita, quando a maioria dos americanos já se apercebeu que o Iraque foi um erro tão grave quanto o Vietname...
A continuar...